Cidades ativas são cidades para o brincar
28/08/2017 | por cidadeativa
*Texto publicado originalmente no Archdaily Brasil e Mobilize*
A importância de brincar na infância colabora para o desenvolvimento social, físico e emocional das crianças. Essa atividade permite que elas que interajam de modo espontâneo umas com as outras e com o espaço, desenvolvendo sua criatividade e sua capacidade de compartilhar e conviver em sociedade.
Para uma parcela da população, o ato de brincar é relacionado a playgrounds em condomínios fechados. Essa escolha por espaços privados está associada a uma visão negativa sobre a cidade, de que ela é insegura, violenta e degradada. Essas crianças só conhecem a cidade através da janela do carro, do transporte escolar, ou através de uma grade, e isso pouco contribui para seu aprendizado e desenvolvimento, já que deixam de conviver com pessoas diferentes e de aprender sobre o local em que vivem. Para outra parcela da população, o brincar é limitado a espaços informais, não projetados originalmente para essa atividade. Na maioria dos bairros periféricos faltam áreas de lazer para crianças, que, por falta de opção, acabam se expondo aos riscos de locais impróprios para o brincar.
O que fica evidente, independente do contexto social, é que são escassos os locais públicos nas cidades pensados ou destinados às crianças, e são inúmeros os prejuízos decorrentes dessa falta de planejamento.
Estar nos espaços públicos colabora para a percepção do olhar da criança sobre a cidade, fazendo com que ela entenda como é o lugar em que mora e tenha a oportunidade de conviver com crianças de contextos socioeconômicos diferentes, troque experiências e se sinta parte de um coletivo diverso. Essa vivência terá grande impacto na atuação dos adultos do futuro: indivíduos que aprendem, desde cedo, a conviver nos espaços públicos têm mais chance de participar de discussões sobre o planejamento das cidades, de zelar pela preservação desses lugares e de se engajar com a transformação de suas comunidades.
Além disso, o brincar faz com que os pequenos estejam em constante movimento, prevenindo problemas relacionados ao sedentarismo e ao excesso de peso, que já atinge um terço das crianças brasileiras. A prática de atividade física também está relacionada a um melhor desempenho escolar e menor incidência de depressão.
Mas, então, qual é o espaço ideal para brincar na cidade?
O brincar está ligado à liberdade, mas a maioria dos espaços de convivência não é pensado para garantir a autonomia e a expressão das crianças. Elas geralmente não decidem a brincadeira a partir do que querem e gostam, mas do que lhes é oferecido. É por isso que as cidades devem garantir condições adequadas de seus espaços públicos e oferecer lugares e brinquedos que desafiem os pequenos. Elementos não pensados para o brincar muitas vezes acabam se tornando os mais divertidos, como escadarias, superfícies vazadas como grades em passarelas ou respiros do metrô, e também dispositivos com água como fontes e espelhos d’água. Estes espaços mais livres exigem da imaginação das crianças, ao invés de trazer um tema ou forma pré-definido de brincar, colaborando também com seu desenvolvimento.
Além disso, diversas iniciativas estão transformando o conceito de brincar na cidade. Um exemplo são os parquinhos do Erê Lab, pensados e projetados para garantir o brincar livre, o movimento e desenvolvimento motor e cognitivo das crianças. Outro exemplo é o programa Ruas Abertas, em São Paulo, que permite a ocupação de espaços da cidade através da abertura de algumas vias aos domingos e feriados. O espaço, amplo e versátil, permite uma infinidade de formas de apropriação espontâneas. Atividades programadas temporárias, como música e brincadeiras, divertem e, ao mesmo tempo, inspiram crianças sobre as maneiras de se ocupar os espaços da cidade. É através dessa experiência que as crianças podem aprender que esse espaço público deve ser destinado às pessoas, e não aos carros.
Iniciativas de coletivos também estão fazendo a diferença na cidade e na vida dos pequenos. São ações que identificaram a importância de envolver as crianças na ativação dos espaços públicos, de ouvir sua opinião, de promover atividades lúdicas na cidade ou, ainda, de incentivar o caminhar e o pedalar, afastando a ideia de que a forma de deslocamento mais segura e desejável é o veículo particular.