2021: nossa saga continua

Se 2020 fosse um roteiro, provavelmente provocaria reações de incredulidade – como o de uma ficção exagerada. Antes fosse. Foi um ano além de qualquer possibilidade imaginada, distópico, em que nos tornamos protagonistas e vivemos – em nossas realidades distintas – muitos extremos. Tivemos que improvisar, acolher sentimentos que quase nos forçaram a desistir, cuidar mais uns dos outros e tivemos que reaprender a acreditar em nossos papéis e em um amanhã melhor: para um desfecho inédito e co-criado. 

Para muita gente, 2020 será lembrado como um ano de perdas: de pessoas queridas, de projetos, de perspectivas. Para a equipe da Cidade Ativa, ficará para sempre o vazio deixado pela imensidão da nossa amiga Marina. Para outras pessoas, a assolação de tantas vidas, de tantos sonhos, de tantas relações, serviu como inspiração e argumento para fazer diferente: trouxemos à tona a necessidade de alinhar pautas ambientais, sociais e econômicas num projeto de futuro inadiável, de cidades mais ativas, seguras e inclusivas durante a após a pandemia da Covid-19. A necessidade de um mundo mais coletivo, equitativo e solidário ficou escancarada, provando que essa missão é de todas e todos nós. Desafiados pelas novas rotinas e hábitos que esse contexto nos impôs, muitos de nós tivemos oportunidade de investir em pesquisas, pensamos e discutimos soluções para os mais diversos temas, idealizamos e testamos inúmeras possibilidades de novas formas de fazer e viver nas cidades. 

Nos últimos meses, vimos como nossas vidas tomaram uma dimensão virtual jamais vista. Chamadas por vídeo e webinars, que já eram uma realidade para nós na Cidade Ativa, invadiram todas as nossas relações pessoais e de trabalho. Organizamos e participamos de incontáveis encontros online, que certamente careceram de trocas de olhares, beijos e abraços, mas que nos permitiram estar em qualquer lugar do mundo, a qualquer hora, com qualquer pessoa. Pudemos “estar” em tantos lugares…em Londres com colegas da UCL, em Cascais com a Câmara Municipal da cidade, em Curitiba com a Smart City Expo, em São Paulo em um evento da ONU, e em Tbílissi, nos perguntando: o que, afinal, temos em comum?

Um ano vivido de forma online mostrou o quanto precisamos de uma vida lá fora. Através de nossas janelas, olhamos para as ruas e lembramos do quão importante é caminhar  – e o que podemos fazer, juntas e juntos, para defender essa causa. Dentro de nossas casas, acolhemos as crianças, relembramos e reinventamos formas de brincar, ensinar e aprender e a valorizar, mais do que nunca, as oportunidades que podemos criar de explorar a cidade com elas. Também, nos unimos a um esforço urgente e coletivo de retomar a nossa conexão, como crianças ou adultos – com a natureza.

2020 foi um ano que nos fez inúmeros convites para que pudéssemos nos posicionar. Um ano de muitas manifestações individuais e coletivas, de muitos ativismos. Em todo o mundo, usamos as redes sociais, as ruas ou as eleições para nos manifestar, para defender nossos sonhos. Foi um ano que colocou à prova a persistência e a articulação de pessoas e organizações que lutam por sociedades mais equitativas.

A verdade é que a saga de 2020 continua – 2021 está já revelando que esse é um roteiro de múltiplos atos. Os vilões, obstáculos e desafios ainda estão presentes, e novos ainda estão sendo introduzidos na narrativa. Não sabemos ao certo se já alcançamos o clímax ou se ele ainda está por vir. Um roteiro como nossas vidas – pouco linear ou previsível – mas que permite que cada dia possamos acordar e escolher como nós, como protagonistas, iremos agir.

Nós, da Cidade Ativa, escolhemos seguir em movimento, contribuindo para tudo aquilo em que acreditamos. 2020 foi certamente um dos anos mais desafiadores de nossas vidas – e só conseguimos chegar até aqui porque tivemos ao nosso lado, ainda que distantes, familiares, amigos e parceiros que também defendem cidades mais justas, seguras e resilientes para todas e todos. Pensar que temos você, junto com a gente nessa jornada, nos motiva a começar 2021 fazendo ainda mais, e melhor. 

Esperamos que em 2021 tenhamos espaço para deixar germinar. Que possamos acolher, com mais calma e foco, os novos e velhos desafios. Deixemos vir com leveza – mas sem nos acomodar ou aceitar um “novo normal” que não resolva as necessidades de inclusão e equidade que nossas sociedades tanto precisam. Que possamos todas e todos estar em segurança – reinventando nossas cidades, atentos às necessidades múltiplas e reais.

E que nossos caminhos continuem se cruzando.